Todo o conhecimento que a Antroposofia traz pode ser benéfico ou motivo de maiores problemas nas nossas vidas. Como preservar a força da infância na criança em cada um de nós ? Para a criança tudo é desfrute e curtição. O adulto sério perdeu a capacidade de perceber a espiritualidade, o divino em todas as pequenas coisas.
A espiritualidade, a gente busca para ser feliz, para nos libertar, e não para aumentar as nossas culpas. Existem duas correntes : 1) a corrente do desejo, que tem a ver com o corpo físico, o organismo onde tudo não depende da consciência, e o problema é a falta de saúde orgânica . 2) a corrente das representações, que vem no sentido inverso à do desejo ; aqui é a capacidade de fazer pensamentos objetivos que depende da atividade do homem e não do organismo.
Na criança o corpo está crescendo demais, então tudo é anabolismo e, portanto, a corrente do desejo é a que está presente e é muito forte ; por outro lado, a capacidade de representação é pequena. Assim o aprendizado na criança é corporal . Nós vivemos em uma cultura que não é amante do lúdico, que reprime toda a manifestação de prazer. A culpa é terrível, e se “nossa criança” não está bem, a culpa domina a gente. O pessimismo e o tédio também vão trazendo problemas a nível orgânico e espiritual.
No sentido do caráter lúdico, Rudolf Steiner dizia que o médico deveria, em cada consulta, devolver a esperança ao paciente, o que significa resgatar a criança. Esse caráter lúdico está relacionado com toda uma série de sentimentos que são parentes da gratidão – quem sabe curtir, não precisa sair correndo atrás de cada coisa e isso previne de prazeres em excesso, porque a cada realização de desejo, a gratidão reverbera preenchendo o ser humano. Temos que aprender a viver com profundidade e alegria a cada momento.
Para a Antroposofia, o universo é um gesto dos mundos espirituais que a criança faz naturalmente e o homem conquista. Nas áreas da nossa alma que não há gratidão, a gente se sente carente, vazio. Uma pessoa grata, sente um débito muito legal com o mundo, ao contrário da culpa.O indivíduo grato diz: “ O que o mundo quer de mim ? ”, e o ingrato :“ O que eu quero do mundo? ”.
Esperança é acreditar que mesmo no pior da vida eu veja que ela tem um sentido. Isso é a retidão do espírito que ocorre por desenvolvimento, e isso é muito diferente de submissão. O nosso encanto dá o sim para a criança, e nosso espanto dá o não.
Gerardo Blanco 04/04/93